CONFIANDO MESMO QUE NÃO COMPREENDENDO

Então, Jesus lhes disse: ‘Em verdade, em verdade vos digo: se não comerdes a carne (τὴν σάρκα) do Filho do Homem, e não beberdes o seu sangue, não tereis a vida em vós mesmos. Quem come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna; e eu o ressuscitarei no último dia. Pois a minha carne é verdadeiramente uma comida e o meu sangue, verdadeiramente uma bebida…’ Tal foi o ensinamento de Jesus na sinagoga de Cafarnaum. Muitos dos seus discípulos, ouvindo-o, disseram: ‘Isto é muito duro! Quem o pode admitir?’.” (João 6,53ss.59s)

Tudo isso ocorre bem antes da Quinta-feira Santa, quando o Senhor em Sua Ceia nos mandou comer certo pão como Seu “corpo” e beber certo cálice como Seu “sangue”. Não há maneira aqui, em João 6, de alguém já ter compreendido estas palavras chocantes sobre “comer a Sua carne” e “beber o Seu sangue”. Assim, não é surpresa que “desde então, muitos dos seus discípulos se retiraram e já não andavam com ele” (João 6,66). O que é surpreendente, penso eu, é alguns deles permanecerem, especificamente, os doze, — embora também não compreendessem essas palavras.

Por que eles permaneceram? Porque eles “creram” ou “confiaram” em Cristo, a Quem eles “vieram a conhecer” como a Única Fonte da Vida, mesmo quando não “compreendiam” muito do que Ele estava dizendo e fazendo. Quando Jesus lhes perguntou, no final de João 6: “Quereis vós também retirar-vos?”. Respondeu-lhe Simão Pedro: “Senhor, a quem iríamos nós? Tu tens as palavras da vida eterna. E nós cremos e sabemos que tu és o Santo de Deus!” (João 6,67ss).

Ter “fé” (ou “πίστις” no grego, que é mais bem traduzido como “confiança”) em alguém não significa “compreendê-lo”, no sentido de “entender” completamente, o que significaria “dominá-lo” como a um assunto acadêmico. A “confiança” não desempenha nenhum papel onde não haja elementos do desconhecido; onde não haja mistério. A “confiança” entra em jogo quando chegamos a “conhecer o suficiente” (mas não tudo) sobre o outro, também em meio a seus momentos “misteriosos”. Nosso Senhor Jesus Cristo, chamando-nos a Si mesmo como Ele chama, às vezes com palavras e ações “misteriosas”, está nos ensinando a permitir o “mistério” em nossos relacionamentos mais importantes, com Deus e com outros entes queridos. Não devemos “dominá-los”, como a um assunto acadêmico, mas “confiar” neles, quando “sabemos o suficiente” sobre eles, assim como queremos que “confiem” em nós, mas sem que nos “dominem”. Graças Te dou, Senhor, por nos ensinar a respeitar a liberdade dos outros e a sermos livres, em nossas afeições.

Versão brasileira: João Antunes

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