JUDAS, ANTISEMITISMO E “NÓS”

Por inveja, os sacerdotes e dos escribas, astutamente se reuniram num conselho contra Vós, Ó Salvador, levando Judas à traição. Ele desavergonhadamente saiu e falou contra Vós, dizendo a um povo transgressor: ‘O que me dareis se eu O entregar em vossas mãos?’. De sua condenação salvai as nossas almas, Ó Senhor!” (Kathisma, Matinas da Grande Terça-feira Santa)

Qual é o objetivo da hinografia de nossa Igreja esta semana, quando lamenta os pecados dos “maus” na história da paixão de Cristo, — o establishment religioso judeu “ortodoxo” da época, os sacerdotes e escribas, e Judas, um dos doze discípulos (também judeus)? Acaso é nosso propósito apontar um dedo antissemita aos judeus, ou colocar a responsabilidade pela crucificação do Senhor nos pés de todo o povo judeu, ou mesmo apenas nos pés desse povo judeu específico, mencionado nos Evangelhos? Estaremos “nós” sendo chamados a assumir o papel de espectadores inocentes, expressando uma indignação (auto) justificada ante um crime judaico?

Não. Estes textos falam de todos “nós”, tanto dos judeus como dos cristãos Ortodoxos não-judeus, que hoje celebram estes ofícios da Grande Semana Santa e cantam esta hinografia. Estamos sendo chamados a reconhecer e a considerar os nossos vários papéis, tanto como cristãos Ortodoxos individuais, quanto comunalmente como Igreja, na contínua “história” da História da Salvação. Estaremos por vezes interpelando “um povo transgressor”, como fez Judas, “O que me dareis se eu O entregar…?”, quando manipulamos alguém ou algum sistema/instituição a fim de obter algum ganho financeiro, político, social ou talvez romântico, enquanto colocamos nossa fé cristã de lado para fazer isso? Devemos fazer tais perguntas esta semana, e é por isso que o hino acima citado termina com as palavras: “De sua condenação salvai as nossas almas, ó Senhor!” — Ou será que nós, como o establishment religioso da nossa Igreja, procuramos silenciar a Cristo, como fizeram aqueles sacerdotes e escribas, quando procuramos eliminar os que dizem a verdade entre nós, que desafiam as noções “politicamente corretas” da “Ortodoxia” dos tempos modernos? Não somos por vezes cegos pela nossa(s) própria(s) verdade(s), quando Deus nos envia novas revelações, como fez aos sacerdotes e escribas, através do Seu Filho Unigênito?

Ao longo dos ofícios litúrgicos desta Grande Semana Santa, quando louvamos a Nosso Senhor Jesus Cristo, Que era judeu, não estamos louvando todo o povo judeu. Nem estamos louvando todos os homens brancos com barba, embora Ele também fosse assim. Também não estamos castigando todos os “sacerdotes e escribas”, ou todos os “sacerdotes e escribas” judeus, ou discípulos judeus de Cristo, ou todo o povo judeu em geral, quando lamentamos os comportamentos traiçoeiros dessas autoridades religiosas ou discípulos do tempo de Cristo. Somos antes de tudo chamados a lamentar e a repensar os nossos próprios comportamentos traiçoeiros, que são “apenas humanos”. Mas Ele veio, e morreu, e ressuscitou, para que participemos em tudo isso, do lado correto da Cruz, no realismo gentil e autocrítico que é a humildade, — na humanidade não só “humana”, mas divinizada do ladrão penitente. Que eu, pois, diga hoje com ele: “Lembrai-Vos de mim, Senhor, quando entrardes no Vosso reino!”

Versão brasileira: João Antunes

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