“Havia um homem rico, que se vestia de púrpura e de linho finíssimo, e que todos os dias se regalava esplendidamente. Um mendigo chamado Lázaro, coberto de chagas, fora deitado ao seu portão, desejoso de fartar-se com as migalhas que caíam da mesa do rico; e até os cães vinham lamber-lhe as úlceras. Morreu o mendigo, e foi levado pelos anjos para o seio de Abraão; morreu também o rico, e foi sepultado.” (Lucas 16,19-22)
Nesta parábola, tema do nosso Triodion Quaresmal esta semana, nosso Senhor está alertando sobre o aparato religioso do Seu tempo; os sacerdotes que estavam “vestidos de púrpura e linho finíssimo”, que não O “viam” por Quem Ele era, nem notavam outras pessoas deitadas como mendigos ao seu portão. Não acreditariam n’Ele, “ainda que ressuscitasse alguém dos mortos” (como diz Abraão ao homem rico mais adiante nesta parábola, Lucas 16,31), como fez outro Lázaro, o de Betânia. As autoridades religiosas eram tão “ricas”, tão cheias de si mesmas, que não conseguiam ver Outro. Tinham assuntos mais importantes a tratar, nomeadamente, a “plenitude” do seu confortável status quo, e a proteção de tudo isso.
Hoje, quando o meu querido amigo Alexey Navalny está morrendo ao nosso “portão”, nós, como Igreja, a Igreja Ortodoxa Russa, estamos tão cheios de nós mesmos, que nos calamos, porque parecemos crer que proteger o nosso status quo é mais importante do que a vida deste Lázaro, que não pertence à nossa sociedade de elite que possui “a plenitude da fé”, como os cristãos Ortodoxos de hoje em dia gostam de afirmar. Mas não nos enganemos, e recordemos que o status quo mudará, quando todos nós estivermos perante Deus em Seu julgamento final, e os Lázaros e Alexeys estiverem repousando no seio de Abraão. Apoiemo-lo agora, como Cristo nos exorta a fazer, independente de como este apoio possa parecer pouco benéfico para o nosso “se regalar” de hoje. “Passará o céu e a terra, mas não passarão as minhas palavras” (Mateus 24,35).
Versão brasileira: João Antunes
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