
“O comandante do templo dirigiu-se imediatamente para lá com os guardas e trouxe os Apóstolos, mas não à força, pois receavam ser apedrejados pelo povo. Trouxeram-nos, pois, e levaram-nos à presença do Sinédrio. O Sumo Sacerdote (ὁ ἀρχιερεὺς), interrogando-os, disse: ‘Proibimo-vos formalmente de ensinardes nesse nome, mas vós enchestes Jerusalém com a vossa doutrina e quereis fazer recair sobre nós o sangue desse homem’. Mas Pedro e os Apóstolos responderam: ‘Importa mais obedecer (πειθαρχεῖν) a Deus do que aos homens. O Deus dos nossos pais ressuscitou Jesus, a quem matastes, suspendendo-o num madeiro. Foi a Ele que Deus elevou, com a sua direita, como Príncipe e Salvador, a fim de conceder a Israel o arrependimento e a remissão dos pecados. E nós somos testemunhas destas coisas, juntamente com o Espírito Santo, que Deus tem concedido àqueles que lhe obedecem’. Enraivecidos com tal linguagem, pensaram a sério em matá-los.” (Atos 5,26-33)
A leitura de hoje do Livro dos Atos dos Santos Apóstolos é mais uma passagem do Novo Testamento que parece estar em desacordo com a cultura da Igreja Cristã Ortodoxa contemporânea. O comportamento dos apóstolos na leitura citada acima parece desafiar duas coisas que valorizamos muito: 1. A autoridade de um “conselho” tradicional; e 2. A obediência aos homens. Quero dizer, a homens dotados de autoridade tradicional e religiosa, como um sumo sacerdote ou “ἀρχιερεὺς”. Recordemos que, antes de Sua paixão, Cristo disse a Seus discípulos que as autoridades religiosas judaicas “instalaram-se na cátedra de Moisés”. Portanto, “observai [praticai] tudo o que eles disserem” (Mateus 23,2s). Ele acrescentou: “mas não imiteis as suas obras, pois eles dizem e não fazem…”, e isso não mudou o fato de que eles deviam obediência a essas autoridades.
Mas depois do Pentecostes, algo mudou nesse sentido. E na leitura de hoje, vemos o tipo de obediência que os apóstolos praticavam e professavam perante as mais altas autoridades religiosas de sua época. São Pedro e os outros concordam em ser levados perante o Supremo “Conselho” e tribunal do povo judeu, o Sinédrio, “não à força”, mas não deixam de testificar a verdade “neste nome”, no nome de Jesus Cristo, que é algo que o Conselho “proibiu formalmente”, para que eles parassem de fazer. Mas “importa mais obedecer (peith-archein, de “peitho” que significa confiança/fé e “archo” que significa governar/(ter) autoridade) a Deus do que aos homens”, diz Pedro, recordando-nos que a Igreja Apostólica deve confiar/ter fé e obedecer, antes de tudo, a Deus, e não a qualquer conselho de homens, por mais autoridade tradicional que tenha, quando esse conselho não estiver obedecendo ao Espírito Santo.
Ao lermos os Atos dos Apóstolos neste período litúrgico que leva ao Pentecostes, conhecido como “o nascimento da Igreja”, somos recordados de certos aspectos básicos de ser uma Igreja “Apostólica”; de ser uma Igreja que compartilha o tipo de fé, testemunho e obediência que foram praticados e professados pelos Santos Apóstolos. Este é um tempo de reflexão eclesiológica, especialmente vital em nossa época de crise eclesiológica, quando em nossa Igreja Ortodoxa Russa um “Sumo Sacerdote” preside um “Conselho” (o “Conselho Mundial do Povo Russo”) que professa uma heresia assassina de “Guerra Santa”, blasfemando contra o Espírito Santo e exigindo de seu clero obediência absoluta à sua pauta. Será que devemos obediência a esse “Sumo Sacerdote”? O que os apóstolos fariam? Acho que a leitura de hoje nos ajuda a responder a essa última pergunta. Santos Apóstolos, rogai a Deus por nós!
Versão brasileira: João Antunes
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