Nesta terça-feira — que, em grego e hebraico, é chamada de “O Terceiro Dia” — relembramos o Dia 3 da criação, quando Deus criou as plantas, as sementes e as árvores. E é justamente sobre uma dessas árvores do Jardim do Éden que venho refletindo hoje. Estou falando da Árvore do Conhecimento do Bem e do Mal, que nos trouxe tanta confusão, especialmente porque, à primeira vista, pareceria algo bom — afinal, ter conhecimento do bem e do mal soa positivo.
Segundo a explicação de Gregório de Nissa (em De hominis opificio, 20), que tenho relido nos últimos dias, o problema do fruto dessa árvore é que ele oferece um “conhecimento misturado” (η σύμμικτος γνωσις), ou seja, uma mistura de bem e mal em um único fruto. Não é algo absolutamente mau, nem puramente bom — ao contrário, é bastante atraente ao olhar. Assim como muitos dos nossos desejos desordenados e obsessões pecaminosas, que tendemos a racionalizar por conterem uma parcela de “bondade”. E é justamente essa parcela de bem ou de beleza que nos engana, porque, como escreve Gregório de Nissa, “o ser humano não teria sido enganado por um mal evidente.” Obrigado a Gregório por esse esclarecimento.
O que Deus nos chama a buscar, segundo este brilhante Padre da Igreja, não é o conhecimento do bem e do mal, mas sim o discernimento entre o bem e o mal.
Além disso, vale destacar o trecho em que Deus diz que podemos comer “de todas as árvores (ἀπὸ παντὸς ξύλου)” do jardim para alimento.
Gregório faz um belo jogo com as palavras “de todas as árvores”, interpretando isso como “da Árvore de Tudo”. A “Árvore de Tudo”, da qual nos era permitido comer, nos alimentava com o todo — ou seja, com toda forma de bem. E aqui vem o ponto mais surpreendente: São Gregório afirma que essa Árvore de Tudo é a mesma que a Árvore da Vida. (!)
Portanto, o fruto permitido no Jardim do “Éden” — e “Éden” significa “deleite” — continha tudo o que era verdadeiramente bom e realmente encantador. Inclusive o tipo de alimento que conduz ao crescimento na sabedoria e no discernimento, ou seja, o bom tipo de conhecimento. Assim, esse fruto não nos impedia de alcançar a “teleiotis” — a perfeição ou amadurecimento eterno — em semelhança a Deus, como a serpente tentou nos convencer ao dizer a Eva que Deus não queria que o ser humano fosse “como” Ele.
Se a serpente estivesse certa (e agora falo por mim, não por Gregório), e Deus realmente não quisesse que crescêssemos ou evoluíssemos no Paraíso, isso significaria que o Paraíso seria um lugar monótono, onde não há evolução nem realização do potencial que Ele mesmo nos deu. Seria como uma viagem de férias que, depois de alguns dias, perde a graça. Mas não é isso que Deus nos promete ao falar de “descanso” n’Ele. Ele mesmo “descansou” no sétimo dia, mas isso não quer dizer que tenha ficado inativo — como diz Jesus em João 5,17: “O meu Pai continua a realizar obras até agora, e Eu também continuo!”.
A conclusão mais encantadora das reflexões de São Gregório de Nissa é esta: o Reino dos Céus não é um lugar estático (ou “stasis”, como diriam outros pais e filósofos) nem monótono, mas haverá um movimento dinâmico (kinesis) e um constante cumprimento e realização (telos) em Cristo. E o diálogo com Ele jamais terá fim. Afinal, até no topo da montanha há diálogo — como aconteceu com Moisés e Elias no Monte da Transfiguração.