O ESTIGMA DO ENVELHECIMENTO E DA ESTERILIDADE

Pela tua santa natividade, ó Pura,
Joaquim e Ana foram libertos do opróbrio da esterilidade (поношенiя беcчадства)
Teu povo, salvo da escravidão do pecado
te festeja, exclamando: a estéril dá a luz,
a mãe de Deus que alimenta nossa vida!
(Kondakion da Natividade da Santa Mãe de Deus)

Ontem visitei pela primeira vez o santuário de Padre Pio, na Província de Foggia, Itália. Padre Pio, um santo católico muito popular, carregava os “estigmas” das chagas de Cristo em suas mãos, pés e lado. Essas feridas, que cicatrizaram pouco antes de sua morte, aos 81 anos, em 23 de setembro de 1968, lhe causaram não apenas dor física, mas também grande vergonha. Ele foi investigado mais de uma vez pelas autoridades da Igreja, acusado de ter provocado em si mesmo os estigmas, entre outras coisas. Por isso, Padre Pio costumava usar luvas para escondê-los. Para mim, como cristã Ortodoxa, foi algo incomum e até um tanto desconcertante encontrar esse santo, pois na Igreja Ortodoxa não conheço santos que tenham sido “estigmatizados” dessa forma.

Mas, hoje, quando os fiéis que seguem o Calendário Juliano Tradicional celebram a Natividade da Theotokos, acordei com o pensamento de que São Joaquim e Santa Ana, os pais da Theotokos, foram estigmatizados durante a maior parte de suas vidas como um casal “não abençoado” com filhos. Apesar desse trauma, eles perseveraram na fé e no amor mútuo, e seu estigma, ou opróbrio, foi retirado já em idade avançada, quando conceberam e trouxeram ao mundo aquela que “alimenta nossa vida”, a Theotokos.

O Kondakion da festa de hoje nos mostra que todos nós, como portadores da cruz, podemos nos identificar com “o opróbrio da esterilidade”, na medida em que carregamos “a escravidão do pecado” e também o sentimento de termos falhado de uma ou outra forma nos objetivos que tínhamos diante de nós. Ao envelhecer em uma cultura obcecada pelo “anti-idade”, podemos facilmente cair na tentação de ver os sinais do envelhecimento como algum tipo de fracasso, experimentando culpa diante das dificuldades com o controle do peso, perda de memória, flacidez da pele, diminuição da mobilidade e outras limitações.

Porém, se entregarmos ao nosso Senhor crucificado e ressuscitado as feridas internas ou externas, os “traumas” que carregamos (a palavra grega trauma significa “ferida”), podemos também aprender a vê-los como Suas feridas, Suas “marcas”, que nos conduzem e nos alimentam em uma nova vida n’Ele, assim como aos outros. De nossas próprias maneiras, como Igreja, somos chamados a nos tornarmos “curadores feridos” na comunhão dos santos.

“De agora em diante ninguém mais me venha perturbar”, podemos dizer com São Paulo, “pois eu levo no meu corpo as marcas (στίγματα, stigmata) de Jesus” (Gálatas 6,17).

Pelas orações de todos os Teus santos e da Santíssima Theotokos, ó Salvador, salva-nos!
Feliz festa, amigos que seguem o Calendário Juliano Tradicional!