
“E o Verbo fez-se homem
e veio habitar conosco.
E nós contemplamos a sua glória,
a glória que possui como Filho Unigênito do Pai,
cheio de graça e de verdade.”
(João 1,14)
Aqui vai uma curiosidade interessante que observei neste ano, tendo assistido pela primeira vez à bela celebração do Natal em Roma. Nas igrejas católico-romanas, o início do Evangelho segundo João (“No princípio existia o Verbo…”) é a leitura do Evangelho para o dia de Natal. Isso é diferente da tradição bizantina, na qual lemos o começo de João não no Natal, mas na Páscoa.
Em ambos os casos, nas tradições ocidental e oriental, essa leitura acentua que o Evento em questão (seja o Natal ou a Páscoa) é um novo começo, porque suas primeiras palavras, “No princípio existia o Verbo”, ecoam o início da criação na Bíblia, que diz: “No princípio Deus criou os céus e a terra”. E ela direciona nossa atenção não para o aspecto histórico do Evento, isto é, não para as narrativas evangélicas sobre o nascimento em Belém ou sobre a ressurreição, mas para o seu aspecto místico, para sua “glória”. Em sentido contrário, a leitura do Evangelho para o dia de Natal na tradição bizantina (Mateus 2,1-12, a visita dos Magos) e a leitura católico-romana para o Domingo de Páscoa (João 20,1-9, Maria Madalena e os discípulos no túmulo vazio) concentram-se nas narrativas históricas do Evento.
Embora muitos tendam a ver as tradições cristãs orientais como mais místicas do que históricas, e as ocidentais como mais históricas, de modo geral, os exemplos acima indicam que isso não é bem assim. Vale notar que ambas as tradições possuem leituras e hinos (nos dias que antecedem ambas as festas) que abrangem tanto seus aspectos históricos quanto místicos, de modo que as leituras do dia principal da festa não apresentam o quadro completo de como as celebrações são vividas. Outro ponto importante é que, independentemente das leituras e hinos entoados na igreja, eles só influenciam a celebração na medida em que nós, a assembleia que celebra, no Oriente ou no Ocidente, prestamos atenção a eles. Em ambas as tradições temos sistemas litúrgicos (nas leituras e hinos, nos ritos e costumes) tanto para nos envolvermos com o histórico, a história do Evento, quanto para aprofundar seus aspectos místicos. Mas isso exige também algum esforço fora das celebrações litúrgicas para nos educarmos nessas questões.
São apenas algumas reflexões sobre um tema imenso, meus amigos. Feliz Natal e/ou Dia de Santo Estêvão (celebrado hoje nas tradições ocidentais, mas amanhã no calendário bizantino)!
Versão brasileira: João Antunes
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