“Não vos aflijais, nem digais: ‘Que comeremos?’ ‘Que beberemos?’ ‘Com que nos vestiremos?’ São os pagãos que se preocupam com tudo isso. Ora, vosso Pai celeste sabe que necessitais de tudo isso. Buscai em primeiro lugar o Reino de Deus e a sua justiça e todas estas coisas vos serão dadas em acréscimo.” (Mateus 6,31ss)
Pode parecer irônico que hoje, quando nós, cristãos Ortodoxos, ao iniciarmos o Jejum dos Apóstolos, também termos essa leitura, na qual o Senhor nos ordena a não “nos afligir” sobre o “que” comer ou beber (ou com que nos vestir). Mas enquanto ajustamos nossas escolhas alimentares de acordo com as regras de jejum de nossa Igreja (abstendo-nos de carne e laticínios), não o fazemos “nos afligindo”. Fazemos isso por um ato intencional de nossa vontade eclesial comum, para (re)focar, juntos, em “buscar em primeiro lugar o Reino de Deus e a Sua justiça”. E, como tal, como um ato de nossa vontade, nosso jejum coletivo não é somente autolimitador, ele é libertador, particularmente da “ansiedade”. Pois a ação com propósito é fortalecedora, enquanto que a inatividade e a ausência de objetivos geram ansiedade, ou mesmo aflição. Como G. K. Chesterton escreveu: “Todo ato de vontade é um ato de autolimitação. Desejar ação é desejar limitação. Nesse sentido, todo ato é um ato de autossacrifício. Quando você escolhe qualquer coisa, você rejeita todo o resto… A arte é uma limitação; a essência de cada imagem é o quadro [numa moldura]… Este é certamente o caso de toda a criação artística, que é, de certa forma, o exemplo mais decisivo da vontade pura. O artista ama suas limitações: elas constituem a coisa que ele está fazendo”.
Hoje, quando assumimos a “arte” do jejum, eu digo: Graças Te dou, Deus, pela estrutura de nossa bela Tradição. Que amemos nossas limitações e que “amemo-nos uns aos outros”, neste período de jejum, “para que confessemos em unidade de espírito: o Pai e o Filho e o Espírito Santo, Trindade consubstancial e indivisível”.
Versão brasileira: João Antunes
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