“E, chegada a hora sexta, houve trevas sobre toda a terra até à hora nona. E, à hora nona, Jesus exclamou com grande voz, dizendo: ‘Eloi, Eloi, lama sabactâni?’ que, traduzido, é: ‘Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?’. E alguns dos que ali estavam, ouvindo isto, diziam: ‘Eis que chama por Elias’. E um deles correu a embeber uma esponja em vinagre, e, pondo-a numa cana, deu-lho a beber, dizendo: ‘Deixai, vejamos se virá Elias tirá-lo’. E Jesus, dando um grande brado, expirou. E o véu do templo se rasgou em dois, d’alto a baixo. E o centurião, que estava defronte dele, vendo que assim clamando expirara, disse: ‘Verdadeiramente este homem era o Filho de Deus’.” (Marcos 15,33-39)
Nesta Sexta-feira Santa (para aqueles que celebram a Páscoa este fim-de-semana) ou terceira Sexta-feira da Quaresma (para aqueles que seguem o Calendário Juliano Tradicional), estou pensando a respeito dessa sexta-feira há mais de dois milênios, quando as coisas mudaram tão radicalmente entre nós e Deus. O “véu do templo”, que separava o Santo dos Santos, a morada terrena de Deus, do resto do templo onde os seres humanos habitavam, “se rasgou em dois”. A separação entre nós e Deus estava sendo superada na morte de Cristo. Ele tinha assumido o nosso “pecado”, que nos separava de Deus, e as suas consequências, ou seja, morte, trevas, e até desespero, a fim de “pisar” tudo isso e tirar-nos disso, n’Ele.
Como é que Ele “nos” tira disso, e não apenas a Ele próprio? Porque Ele partilha a nossa humanidade, a nossa natureza humana, tendo-Se tornado homem. Partilhamos uma unidade inerente, uma ligação, de ser humano para ser humano, tanto física como espiritual, embora seja fácil de perder de vista este fato no meio das nossas divisões. A nossa ligação espiritual é o nosso único e exclusivo Criador, o Espírito de Deus Que nos insuflou a vida. A nossa ligação física, já óbvia no fato científico de que a nossa composição genética é 99,9% idêntica, torna-se profundamente mais íntima no Corpo de Cristo, do qual Ele nos convida a participar na Sagrada Comunhão.
Hoje na “hora sexta” (ou seja, meio-dia) e na “hora nona” (3 horas da tarde) que eu faça uma uma pausa e recorde as “trevas sobre toda a terra”, a “grande voz” do Deus Homem, exclamando em nosso desespero, e o “rasgar em dois” daquele véu de separação, através do “último” suspiro do meu Senhor. “Na hora nona, provaste a morte na carne por nosso bem, ó Cristo Deus. Põe também à morte a nossa mente carnal (pensamento segundo a carne, τῆς σαρκὸς σαρκὸς ἡμῶν τὸ φρόνημα, плоти нашея мудрование), e salva-nos!” (Tropário Bizantino da Hora Nona).
Versão brasileira: João Antunes
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